terça-feira, 28 de junho de 2011

O problema do "não-ser" em Parmênides - Conclusão


Agora que sabemos as características principais daquilo que <é>, resta-nos procurar responder as questões elaboradas no início deste trabalho sobre aquilo que . Kirk, Raven e Schofield iniciam a busca pela resposta dos questionamentos colocados, destacando a impossibilidade de se conhecer aquilo que não existe. Entretanto, uma afirmação posterior feita por eles esclarece esta questão que, a princípio, parece ser insolúvel: “... impossível é, segundo parece, conhecer ou dar a conhecer o que não é uma coisa ou outra, o que não possui atributos e não tem predicados verdadeiros seus.”(KIRK, p. 256) O problema, portanto, ao procurar entender aquilo que , é justamente em estabelecer que este não é isto ou aquilo, sem características próprias e, por este motivo, incognoscível a qualquer pessoa. No entanto, outra característica apontada pelos autores sobre aquilo que , e que fornece nossa informação mais valiosa, se baseia no fato de que este não nasce nem morre. Tal afirmação é retirada do próprio Parmênides, como se segue: “... Não te permitirei que digas ou que penses a partir do que não é: pois é indizível e impensável o que não é... Por isso a Justiça jamais soltou as grilhetas para lhe permitir nascer ou perecer, antes as segura firmemente.”(KIRK, p. 260)
Todas estas conclusões, no entanto, ainda não oferecem a segurança necessária para as questões propostas no início deste trabalho sejam solucionadas. E isto acontece porque o caminho que proposto pela deusa ainda precisa de um melhor esclarecimento. No entanto, a pergunta proposta pelos autores sobre a função do verbo estin em nossa tradução já possui resposta: aquilo que <é>; necessariamente deve existir e, mais, mesmo que nesta realidade não existe nada que se assemelhe ao que <é>; este participa de tudo o que existe, assim tudo o que é só é devido a esta participação daquilo que <é>.
Logo, aquilo que em nada participa, pois não nasce e nem virá a nascer. Aparentemente, tal conclusão não resolve as questões propostas, entretanto, veremos que o que os autores classificam como O erro dos mortais (KIRK, p. 257) nos dão a resposta que precisamos e corrobora o caminho que é proposto pela deusa. A deusa apesar de advertir sobre a necessidade de escolher o caminho que <é>, no entanto, não é capaz de obrigar alguém a segui-lo. E é neste momento que o caminho daquilo que surge como opção, não como se ele realmente existisse – pois já vimos que este não pode existir, visto que ele nunca nasceu – mas como resultado da indecisão daquele que não escolheu o verdadeiro caminho. É na indecisão que “surge” o caminho que : “Isto te ordeno que ponderes, pois é este o primeiro caminho de investigação, do qual eu te afasto, logo, pois daquele, em que vagueiam os mortais que nada sabem, gente dicéfala...que julgam que ser e não ser são e não são a mesma coisa.” (KIRK, p. 257)

          Para quem não sabe qual o verdadeiro caminho, não existe diferença entre aquilo que <é> e o que < não é>, esta não diferenciação iguala ambos os caminhos, o que é inaceitável para a deusa. Não deve existir a possibilidade do que seja, pois é forçoso – como afirma a deusa – que ele não seja, pois ele nada é.  Mas, se a escolha pelo verdadeiro caminho não é feita, surge não somente o caminho daquilo que , mas ainda um terceiro caminho que é o da indecisão, da ignorância sobre aquilo que <é>.

3 comentários:

  1. Um dos dialogantes se expressa enfaticamente: "O grande Parmênides" (Sofista 237 a).

    Outro, que é Sócrates, não deixou por menor sua admiração: "A meu parecer, Parmênides, como um herói de Homero, é venerável e temível. Tive contato com este homem (diz Sócrates) quando eu era jovem e ele velho, e justamente me pareceu que tinha pensamentos profundos; temia não compreender suas palavras e que seu pensamento nos deixasse atrás" (Teeteto, 183 e).

    Deste homem tão conceituado se conhecem todavia mui poucos episódios biográficos. Isto pode significar que se concentrou mais com a vida intelectual, do que com atividades administrativas. Diógenes Laércio, um dos raros informantes, dedicou a Parmênides tão só uma página, em que se refere à vida e à doutrina do mesmo. E o que se encontra nos diálogos de Platão, ainda que seja em forma de ficção, tem ao menos a validade testemunhal do prestígio doutrinário de Parmênides.

    O mesmo acontece com as citações fragmentárias feitas do poema de Parmênides. Não trazendo embora informações biográficas, ao menos transmitiram o referido texto, o qual veio através de Teofrasto, Simplício, Sexto Empírico, Plotino, Proclo, Clemento de Alexandria e outros.

    "Parmênides de Elea, filho de Pireto, era discípulo de Xenófanes (ou de Anaximandro, diz Teofrasto no Compêndio).

    Ainda que discípulo de Xenófanes, abandonou suas doutrinas para seguir a Amínias e ao pitagórico Dioquete, homem pobre, segundo Sócion, porém. homem honesto e virtuoso. Dioquete era seu mestre predileto e, depois de sua morte, lhe edificou uma capela como a um herói. Rico e de ilustre nascimento. deveu mais a Amínias que a Xenófanes, seus estudos filosóficos, que levam à tranquilidade" (D. L., IX, 21).

    Conhecendo embora o diálogo platônico denominado Parmênides, ao qual também cita Diógenes Laércio não incluiu o que alise narra, como sendo parte biográfica real de Parmênides. Se fosse, dever-se-ia dizer que Parmênides estivera em Atenas pela volta de 450 a.e.c., quando Sócrates era ainda jovem e que teria tido conhecido então o eleata e com ele dialogado. Nesta hipótese, inclusive, dever-se-á retardar a data de nascimento de Parmênides pelo menos 515 a.e.c.

    A cronologia de Parmênides toma como base a afirmativa de Diógenes Laércio: "Floresceu na 69ª. Olimpíada" 504-501 a.e.c. (D. L., IX, 23). Esta data combina com as informações do mesmo Laércio, de que Parmênides fora discípulo de Xenófanes e de Anaximandro.

    Também Aristóteles opina de maneira semelhante quando diz: "Quanto a Xenófanes, o mais antigo adepto da unidade (pois se diz que Parmênides foi seu discípulo)" (Metafísica, 986 b 20).

    Sabe-se ainda: "Diz Espeusipo, em sua História dos filósofos, que havia dado leis aos seus concidadãos" (D. Laércio, IX, 23).

    Isto quer dizer que Parmênides poderia ter ocupado posição de destaque em sua cidade, que era de recente fundação, de Jônicos vindos da Ásia menor. As referências doxográfìcas a Parmênides se devem principalmente aos filósofos que se ocuparam de importantes questões ontológicas e gnosiólogas, como Platão, Aristóteles, Teofrasto, Simplício, Sexto Empírico.

    Ao mesmo tempo os doxógrafos fizeram citações relativamente numerosas dos textos originais do mesmo Parmênides. Dali resultou a possibilidade de reconstruir, pelo menos sofrivelmente, o texto propriamente dito.

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  2. O texto filosófico de Parmênides não poderia ter sido mais solene, do que a forma de poema, que lhe deu.

    "Nosso filósofo expôs suas doutrinas em verso, tal como fizeram Hesíodo, Xenófanes e Empédocles" (D. Laércio, IX, 22). Pelo conteúdo terá tido o nome Sobre a natureza, tal como acontece com as obras de Anaximandro, Anaxímenes, Heráclito.

    Restando embora apenas fragmentos, consegue-se conectá-los entre si, reconstruindo-se o texto. Sexto Empírico (VII,111) citou os versos 1 a 30. Estes se aglutinam com as citações de Simplício (Do céu, 557, 20) com os versos de 28 a 32. Da combinação de ambos se obtém a ordem interna do Frag. l do poema de Parmênides. Eis a Introdução, ou Proêmio, que solenemente introduz ao poema, e que nesta parte inicial se lê espontaneamente.

    Seguem-se, empequenas dimensões, os fragmentos 2, 3, 4, 5, 6 respectivamente citados por Proclo, Clemente de Alexandria (duas vezes), de novo Proclo. Esta página introduz as teses fundamentais sobre o ser, e se fazem admirar pelo impacto com são apresentadas. Continua a reconstrução do texto com o grande enredo dos fragmentos 7 e 8. Representam mais duas páginas no texto geral do poema, e que se ocupam com a doutrina do ser.

    O fragmento 7 deriva das citações de Platão (Sofista 237 a), versos 7, 1-2; e das citações de Sexto Empírico (VII, ll4), versos 3, 3-6. O fragmento 8 reúne duas citações de Simplício (Física, 114,29), versos 8,1-52; e (Física, 38,28) versos 50-61. Depois deste texto central, seguem-se os 11 textos menores finais, ocupando-se com a doutrina de Parmênides sobre a natureza:

    fragmento 9 de Simplício; fragmento 10 de Clemente de Alexandria; fragmentos 11 e 12 de novo, de Simplício; fragmento 13 de Platão (Banquete 178 b); fragmentos 14 e 15 de Plutarco; fragmento 16 de Aristóteles (Metafísica 1009 b 21); fragmento 17 de Galeno; fragmento 18 de Célio Aureliano; fragmento 19 de Simplício (sendo este autor o que apresenta maior número de versos, seguido de Sexto Empírico).

    Na tradução, o que nos importa hoje não é a reprodução cadenciada dos versos, mais que a enunciação direta do conteúdo das proposições. Importa atender primeiramente para o texto mesmo do poema do ser, de Parmênides, para assimilá-lo como um todo, para somente depois fazer sua leitura literária, lógica, física, metafísica.

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  3. O texto filosófico de Parmênides não poderia ter sido mais solene, do que a forma de poema, que lhe deu.

    "Nosso filósofo expôs suas doutrinas em verso, tal como fizeram Hesíodo, Xenófanes e Empédocles" (D. Laércio, IX, 22). Pelo conteúdo terá tido o nome Sobre a natureza, tal como acontece com as obras de Anaximandro, Anaxímenes, Heráclito.

    Restando embora apenas fragmentos, consegue-se conectá-los entre si, reconstruindo-se o texto. Sexto Empírico (VII,111) citou os versos 1 a 30. Estes se aglutinam com as citações de Simplício (Do céu, 557, 20) com os versos de 28 a 32. Da combinação de ambos se obtém a ordem interna do Frag. l do poema de Parmênides. Eis a Introdução, ou Proêmio, que solenemente introduz ao poema, e que nesta parte inicial se lê espontaneamente.

    Seguem-se, empequenas dimensões, os fragmentos 2, 3, 4, 5, 6 respectivamente citados por Proclo, Clemente de Alexandria (duas vezes), de novo Proclo. Esta página introduz as teses fundamentais sobre o ser, e se fazem admirar pelo impacto com são apresentadas. Continua a reconstrução do texto com o grande enredo dos fragmentos 7 e 8. Representam mais duas páginas no texto geral do poema, e que se ocupam com a doutrina do ser.

    O fragmento 7 deriva das citações de Platão (Sofista 237 a), versos 7, 1-2; e das citações de Sexto Empírico (VII, ll4), versos 3, 3-6. O fragmento 8 reúne duas citações de Simplício (Física, 114,29), versos 8,1-52; e (Física, 38,28) versos 50-61. Depois deste texto central, seguem-se os 11 textos menores finais, ocupando-se com a doutrina de Parmênides sobre a natureza:

    fragmento 9 de Simplício; fragmento 10 de Clemente de Alexandria; fragmentos 11 e 12 de novo, de Simplício; fragmento 13 de Platão (Banquete 178 b); fragmentos 14 e 15 de Plutarco; fragmento 16 de Aristóteles (Metafísica 1009 b 21); fragmento 17 de Galeno; fragmento 18 de Célio Aureliano; fragmento 19 de Simplício (sendo este autor o que apresenta maior número de versos, seguido de Sexto Empírico).

    Na tradução, o que nos importa hoje não é a reprodução cadenciada dos versos, mais que a enunciação direta do conteúdo das proposições. Importa atender primeiramente para o texto mesmo do poema do ser, de Parmênides, para assimilá-lo como um todo, para somente depois fazer sua leitura literária, lógica, física, metafísica.

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